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O modelo de negócios pautado na inovação e na simplificação dos sistemas financeiros desenvolvido pelas fintechs obteve grandes êxitos. Os usuários, cativados pela facilidade dos serviços digitais e modernidade ante ao modelo burocrático dos bancos tradicionais, têm apostado nas plataformas online para gerir suas finanças.

Entretanto, muitos clientes desses bancos digitais ainda têm a falsa crença de que estes investimentos seriam inalcançáveis pela penhora diante de uma possível execução. A seguir, elucidarei os principais tópicos envolvendo a penhora de bens para, então, esclarecer a sua relação com as fintechs.

A penhora de bens é medida amplamente utilizada (e, diga-se, popularmente temida) em processos de execução, seja em cumprimento de sentença ou em execução de título extrajudicial. A medida é empregada para a constrição de um bem em garantia ao pagamento da obrigação.

Regulado pelo Código de Processo Civil nos artigos 831 a 836, o procedimento da penhora de bens deve observar certa ordem de preferência, sendo prioritária a penhora de “dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira”.

O ato da penhora de dinheiro em depósito ou aplicação, antigamente realizado através de postagem de ofício ao Banco Central do Brasil, hoje é efetuado de forma online, através de sistema do próprio BCB. O convênio de cooperação técnico-institucional, firmado entre o Banco Central e o Poder Judiciário, denomina-se BacenJud, e possibilita o cumprimento imediato das ordens judiciais de bloqueio de valores.

Assim, determinada a busca e bloqueio de valores pelo magistrado, utiliza-se o sistema BacenJud para a satisfação do crédito. O sistema realiza a busca por saldos em todas as contas do CPF ou CNPJ devedor em instituições cadastradas no Banco Central que integrem o Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), recaindo a penhora sobre os valores existentes.

Ocorre que as fintechs não estão abrangidas pelo rol de instituições participantes do cadastro do BCB, especificadas no artigo 3º do Regulamento do BacenJud 2.0. Para simplificar: essas instituições financeiras não são consideradas “bancos” pelo Banco Central, mas definidas como “empresas que introduzem inovações nos mercados financeiros”.

Portanto, embora constituídas como sociedades de crédito direto (SCD) ou sociedades de empréstimo entre pessoas (SEP) e regulamentadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), as fintechs estão fora do alcance do sistema BacenJud.

Contudo, essa circunstância não significa a intangibilidade das contas digitais pela penhora.

Isso porque, apesar de não serem consideradas “bancos” no sentido estrito, as fintechs ainda consistem em bancos digitais e, mais, constituem instituições financeiras. Nesse sentido, e conforme dispõe o excerto acima colacionado do inciso I do artigo 835, CPC, os valores depositados nestas instituições são, sim, penhoráveis — somente não o são pelo sistema BacenJud.

Desse modo, a maneira processual para penhorar valores de correntistas em fintechs ocorre através da expedição de ofícios pelo juízo, após impulso do exequente, notificando-se a instituição para que informe se há ativos financeiros em nome do executado e realize o consequente bloqueio, isto com fulcro nos artigos 139, IV, 772, III e 773, caput, todos do CPC.

Logo, mesmo que não classificadas como bancos no sentido estrito, as fintechs estão, sim, sujeitas à ordem judicial de bloqueio de valores.

Nesses casos, apesar de não contarem os credores com a facilidade oferecida pelo sistema BacenJud, a legislação permite que tais valores sejam bloqueados, desde que diligenciado o pedido para a expedição de ofícios (ou seja, existe, de fato, maior dificuldade em se indisponibilizar passivos financeiros de forma imediata), nos termos da lei.

Mister ressaltar, entretanto, que há certo desconhecimento destas peculiaridades até mesmo por parte dos magistrados, dado que alguns juízos ainda indeferem pedidos de expedição de ofícios a essas instituições financeiras, porquanto acreditam que o sistema BacenJud abrangeria as nomeadas fintechs.

Outrossim, importante rememorar que, sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro, o processo de execução sempre deverá consistir procedimento célere e justo para o credor. Inclusive, é diante desse contexto que muito já se manifesta pela necessidade de o regulamento do BacenJud adaptar-se e incluir os bancos digitais em seu sistema.

Não há espaço, portanto, para qualquer suposição ou defesa ao resguardo dos ativos financeiros em fintechs a ordens de bloqueio judicial. Porém, ainda assim, é importante manter-se sempre atento às hipóteses de impenhorabilidade, estipuladas nos incisos IV e X do artigo 833, CPC, pelas quais poderá ser revertida, a tempo e modo, a ordem de bloqueio judicial.

Fonte: Conjur